top of page

Piloto automático

Dentro do avião existe um mecanismo chamado Piloto Automático, que é acionado quando o voo atinge determinada altura. À partir daí, não é mais o comandante que detém o controle de bordo. Este equipamento é muito importante para a navegação em voos longos ou em condições de baixa visibilidade, aumenta a segurança e diminui muito a carga de trabalho manual dos pilotos, que podem focar no gerenciamento do voo.


Na vida cotidiana também existe este dispositivo. Há muitas tarefas que fazemos cotidianamente e que, consequentemente, deixamos no piloto automático, executando-as de modo inconsciente. Quais serão as consequências de viver a vida no automático?


O que é viver no piloto automático?


Este mecanismo que existe no avião, também existe em nossas vidas. De modo evolutivo, nossas atividades vão ficando cada vez mais complexas e nos adaptamos deixando parte das tarefas no piloto automático. Mas o que significa isto?

 

Pense nas tarefas que você realiza diariamente, rotineiramente e que não precisa de muito esforço cognitivo para desenvolve-las: o caminho até o trabalho, compras no supermercado, cuidados pessoais... A maioria de nós desenvolveu uma certa repetição para o dia a dia. Os mesmos trajetos, os mesmos lugares, as mesmas comidas, as mesmas pessoas (e na com os mesmos pensamentos que os nossos). O que isto quer dizer: criamos o costume de padronizar tudo e este é um interesse da sociedade de consumo. Padronizando tudo, é mais fácil criar o automatismo necessário para dar conta das múltiplas tarefas que atendem à demandas capitalistas.

 

Muitas vezes passamos por paisagens preciosas sem reparar. Muitas vezes temos a oportunidade de passar momentos incríveis com a família quando chegamos em casa, mas o piloto automático nos leva roboticamente a assistir TV, acessar as redes sociais ou qualquer outra coisa neste sentido.

 

Vamos compreender um pouco mais sobre isto?


O nosso cérebro atual é fruto de milhares de anos de evolução. Desde que existe vida, está em constante busca de economia de energia para ter uma maior durabilidade em momentos de crise (de comida, por exemplo). Para nossos ancestrais isso era de fundamental importância, pois várias vezes tinham que lidar com muito tempo sem alimento.

 

Dada nossa realidade atual, o cérebro continua com o mesmo objetivo de poupar energia. E por isto, muitas vezes nos coloca no piloto automático.

 

E aí acontece coisas que provavelmente já aconteceu com você: estar indo à um destino específico e pegar o caminho para outro local. Ou, de distraído, não lembrar o que iria fazer em determinado lugar. As falhas na memória também pode ter relação com a falta de presença e de atenção.

 

Um modo de viver meio desligado.




As vezes é mais fácil simplesmente se desligar, não tomar decisões, não se posicionar. Acabamos não fazendo escolhas conscientes e quando acordamos deste estado nos perguntemos "Era isso mesmo que eu queria?".

 

 

Quais são as consequências diárias e a longo prazo de viver desta maneira?


O piloto automático, que intencionalmente havíamos criado para cuidar de coisas repetitivas e, por vezes, aborrecidas, ganha vida própria e começa a interceptar tudo que chega até nós.

 

O filme Click, o controle universal, ilustra bem isso. Adam Sandler interpreta um funcionário dedicado, um marido apaixonado e um super pai de dois filhos. Com certeza é difícil equilibrar tudo isso. Um dia, em uma loja de departamento, um funcionário oferece a ele um controle remoto que lhe permite "brincar" com a vida como se fosse um filme. Poderia acelerar as partes chatas, pausar, tirar o som dos personagens que incomodam.



Adam Sandler no pôster de Click (2005), um dos filmes de comédia mais famosos do ator — Foto: Reprodução/Rotten Tomatoes
Adam Sandler no pôster de Click (2005), um dos filmes de comédia mais famosos do ator — Foto: Reprodução/Rotten Tomatoes

Num primeiro momento tudo isso pareceu engraçado e interessante, mas isso não termina bem. O personagem entra no estado de piloto automático e a comédia assume um papel de drama, pois o personagem experimenta, ao final da vida, um vazio existencial e perdas irreversíveis.


Então o que nós podemos tirar deste exemplo? A curto prazo o Piloto automático pode ter muitos pontos positivos. Conseguir realizar várias tarefas de uma vez, economizar energia, ignorar situações e pessoas que incomodam. Mas a partir do momento em que este passa a ser um padrão, algo constante na vida de uma pessoa, ela passa a experimentar perdas importantes. E o pior, sem ter consciência. A consciência vem a longo prazo, quando o casamento termina, quando os amigos se afastam, quando não se sabe o bastante ou o que gostaria de saber sobre os filhos.


E ao contrário do filme Click, na nossa vida real, nós não podemos voltar atrás.


A única coisa que está ao nosso alcance é o presente. Não podemos mudar o que passou e nem tão pouco ter pelo controle com o que está por vir.

 

 O que podemos fazer para exercitar a consciência diante da própria vida?


  • Primeiro e o mais importante, não se cobre tanto: Delegue tarefas, compartilhe suas aflições, aceite e acolha sua vulnerabilidade, saiba dizer não. O piloto automático também é fruto do nosso cansaço.

  • Mude sua rotina: Quando escolhemos fazer coisas diferentes, nosso cérebro é obrigado a sair do piloto automático. Por isso, pegue um caminho diferente, experimente uma nova comida, converse com desconhecidos.

  • Viva sua criança interior: As vezes nosso dia a dia está chato, sem alegria e será que isto é sustentável? Já ouvi dizer que "se não é divertido, não é sustentável". Então, traga a ludicidade ao seu favor! Irá jogar um papel no lixo? Que tal imaginar que a lixeira é uma cesta de basquete? Que tal sair com meias diferentes e ver olhares curiosos durante o dia?

  • Seja gentil: No piloto automático ninguém é gentil. É por isso mesmo que você fica esperando tanto tempo até alguém te dar a vez no trânsito, é por isso que escutamos poucos "bons dias" por aí. Podemos ser a pessoa que muda tudo. Ser gentil é enxergar o outro em seu caminho e agir em prol de seu conforto. Gentileza não precisa ser um gesto grande e excepcional, são as ações pequenas e banhadas de calor humano.


Antigamente se dizia que o nosso cérebro só se desenvolvia na infância. Mas hoje sabemos que o cérebro de um adulto também desenvolve novos caminhos neurais e adapta os já existentes. É o que chamamos de neuroplasticidade. Fazer sempre as mesmas coisas, do mesmo jeito, é prejudicial. A variedade faz o cérebro se desenvolver e funcionar da melhor maneira possível.


Basta prestarmos atenção no comportamento de uma criança: ela está sempre fazendo coisas diferentes, interagindo com tudo e perguntando com curiosidade sobre qualquer coisa.

 

Viver de modo consciente é ter responsabilidade diante da vida e das próprias escolhas. É saber para onde está indo e não deixar o barco perdido. É ter a vida nas próprias mãos.



Camila Marques

Psicóloga, psicoterapeuta e arteterapeuta. Co-fundadora da Escola de Empatia, aprendiz e cultivadora da Comunicação Não Violenta. Apaixonada por Carl Rogers e Rubem Alves; cursou a Formação em Psicologia Clínica na Abordagem Centrada na Pessoa e a Formação em Plantão Psicológico Centrado na Pessoa no CPH-MG; Designer de Sustentabilidade, formada pelo Gaia Education Belo Horizonte; Certificada em Bem estar, Empatia e Felicidade - PUC-RS. É plantonista no Plantão Psicológico do CPH-Minas e psicóloga da Coopeder/MG.

 

Comments


bottom of page