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Fazendo as pazes com os limites



Pessoa seguindo em uma trilha
Google Imagens.

Imagine que você está em uma viagem e seu plano é fazer uma longa trilha para chegar até a cachoeira mais bela da cidade. Mas, ao chegar lá, você se depara com um lugar, sim, muito belo, mas intocado. Não há trilhas, somente matas, árvores e outras plantas silvestres. Você se sente perdido neste paraíso sem limites.


Agora imagine que, ao chegar neste lugar, existe uma trilha que aponta para a cachoeira.


Limites podem ser obstáculos, ou podem ser caminhos.



Alguns limites que conheço:


- Nossa pele;

- Para além da pele, o limite invisível que demarca até onde eu devo ir em relação a alguém;

- Limites geográficos e econômicos;

- Limites do dia, do mês, do ano.


Dentre vários, menciono três que comumente não toleramos: os "nãos", os conflitos e as doenças.



Sobre conflitos e doenças:


Eu realmente acredito que estes dois limitadores da vida são bem parecidos. Isto por várias razões: 1. ambos são inevitáveis e fazem parte da natureza da vida; 2. você somente não verá ou terá estes limitadores caso você adote uma postura de profunda indiferença ou anestesia e, por fim, 3. estes dois limitadores costumam ser vistos como muros, como dores e não como caminhos possíveis.


Antes de adentrar a toda essa complexidade, quero propor a observação sobre o conceito de saúde dado pela Organização Mundial de Saúde (OMS):


Para atualizar a visão distorcida de que saúde seria o contrário de doença, em 1947 a OMS definiu saúde como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença”.


É válido a abrangência às dimensões da vida humana, que vão para além do corpo biológico, mas hoje compreendemos a importância de questionar a que “completo bem-estar” estamos mencionando neste conceito, ou mesmo a que se refere o “bem-estar”? Uma pessoa pode alcançar o bem-estar fumando e, então, isto seria saúde?


Encontramos um grande conflito nesta compreensão inicial sobre o que é saúde e doença. Conflito que vai sendo dialogado pelas ciências e abordagens várias. Aqui, minha perspectiva é a da psicologia humanista, que envolve a abordagem esquematizada por Marshall Rosenberg – a Comunicação Não Violenta.


No curso Saúde Mental em Tempos de Pandemia, que ofereci para alguns públicos (educadoras, gestores e, uma experiência inesquecível, para pessoas que fazem parte dos serviços de prevenção, atendimento e convivência destinado a famílias e indivíduos atingidos pela barragem em Mariana) dialoguei sobre saúde, bem estar, sentido de vida e felicidade na perspectiva da CNV.


De modo sucinto, aqui trago algumas reflexões:

  • A saúde é uma necessidade humana, ou seja, é uma busca que não cessa.

  • A saúde não é uma chegada, mas um destino.

  • Saúde, na perspectiva da Comunicação Não Violenta, está ligada a manutenção da vida, em suas diferentes formas, através da satisfação das necessidades humanas.

Desta forma, doença é o modo fixado, cristalizado de viver - uma pobreza de recursos ou uma crise de criatividade.


Costumo dizer que temos tudo em nossas mãos: em uma delas seguramos firmemente as necessidades humanas, que são inegociáveis; em outra, seguramos com flexibilidade as estratégias, ou seja, os meios pelos quais atenderemos nossas necessidades. É uma dança entre firmeza e flexibilidade, que é diferente da ridigez e da volatilidade.



Quando adoecemos ou temos conflitos, por que focamos no negativo?


Muitas pessoas, ao se depararem com a doença ou com o conflito, adotam uma linguagem trágica, da culpabilização e da vitimização.


“A minha vida é pior do que a de todo mundo”; “Ninguém nunca vai entender as dificuldades que eu vivo”; “É culpa minha estar passando por tudo isso”; “Eu não fui cuidada pelos meus pais” e etc...


Não estou dizendo que você não deva ou não tenha razão de pensar assim, mas digo: nesta vida a questão não é quem tem a razão e sim como iremos fazer para continuar vivendo bem, dignamente, com os limites que temos.


A culpabilização, a vitimização e a raiva são comuns diante do luto que vivemos quando somos “obrigados” pela vida a fazer escolhas diferentes: não comer doces, por exemplo. O sofrimento que se vive no luto talvez seja proporcional à falta de consciência acerca dos recursos necessários para ter a saúde que precisamos. Sofremos porque estamos vendo os obstáculos e não os caminhos.



Fazendo as pazes com os limites


“Ame sem limites”, “Viva sem limites” talvez sejam as falas mais irresponsáveis que uma pessoa pode dizer. Este modo de viver a vida negligencia a condição frágil, vulnerável e finita do ser humano.


Ao ignorar esta condição humana, ignorar os limites, as escolhas que precisam ser feitas, os desafios não deixam de existir, mas nos pegam pelas costas. Por isto, viver uma vida saudável e plena de sentido, para mim, está ligado a nossa postura de honestidade e abertura perante a vida. Honestidade para não negar o inevitável e abertura à consciência em nossa vida e nossas experiências.



Por fim, não deixe que os limites te impeçam de viver


Se você recebeu algum diagnóstico difícil, se estiver enfrentando algum conflito ou crise em sua vida, saiba que esta condição não precisa impedir o seu viver. Sua saúde e bem estar não está limitada a somente uma esfera de sua vida, como por exemplo a biológica, mas ao todo que significa ser você. Ao todo biológico, emocional, social, espiritual.


Quais caminhos são possíveis? Por que você estaria aborrecida frente a um caminho que já foi possível, mas não é mais? Por que continuaríamos a negar todas as perdas possíveis? Como disse Mario Quintana:


"A felicidade bestializa, só o sofrimento humaniza as pessoas."

Por isso, olhe para este caminho bem a sua frente e veja-o constantemente como a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre você!


A vida continuará lhe entregando provas, porque não desistirá de você.


Camila Marques

Psicóloga, psicoterapeuta e arteterapeuta. Co-fundadora da Escola de Empatia, aprendiz e cultivadora da Comunicação Não Violenta. Apaixonada por Carl Rogers e Rubem Alves; cursou a Formação em Psicologia Clínica na Abordagem Centrada na Pessoa e a Formação em Plantão Psicológico Centrado na Pessoa no CPH-MG; Designer de Sustentabilidade, formada pelo Gaia Education Belo Horizonte; Certificada em Bem estar, Empatia e Felicidade - PUC-RS. É plantonista no Plantão Psicológico do CPH-Minas e psicóloga da Coopeder/MG.



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